fonte: G1
Para combater a obesidade, principalmente a infantil, o governo do Chile passou a exigir que as embalagens de todos os produtos sejam realmente claras. A lei demorou 10 anos entre a aprovação e a implementação real, com uma negociação entre o Ministério da Saúde e a indústria alimentícia. O projeto chileno, usado como exemplo positivo pela Organização Mundial da Saúde (OMS), atualmente é estudado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no Brasil.
Quem vai ao supermercado no Chile se depara com dois tipos de embalagens: as que têm selos e as que não têm. O ponto principal da Lei de Alimentos é a exigência, sem exceção para nenhuma empresa, de avisos grandes e em destaque em todos os produtos com altas taxas de açúcar, sal, gordura saturada e calorias.
De acordo com Anna Christina Pinheiro Fernandes, brasileira que trabalha no Ministério da Saúde do Chile e uma das pessoas que ajudaram a implementar o projeto, os 10 anos entre a aprovação da lei e a regulamentação em 2016 foram fundamentais para a discussão com a população e as empresas.
“Demorou porque foi um processo pioneiro. Nenhum outro país tinha feito isso. Precisou ser muito discutido, principalmente com a indústria de alimentos”, contou.
No início, a lei previa um limite de sódio, açúcar, gordura saturada e calorias por 100g de alimentos menor do que está em vigor atualmente para poderem permanecer sem os selos. No entanto, devido à necessidade de adequação da produção, foi necessário estabelecer um calendário para redução gradual até 2019.
Obesidade infantil
As crianças são prioridade na Lei de Alimentos. Segundo os últimos dados de nutrição infantil no Chile, 34,6% das pessoas com até 6 anos são obesas ou têm sobrepeso.
“A curva da prevalência da obesidade infantil nos menores de 6 anos na última década não tem um único ponto de inflexão”, disse Anna Fernandes.
Com base nesses dados, duas medidas atreladas às novas embalagens foram tomadas:
- Proibir a venda de alimentos com selos nas escolas públicas e particulares do Chile.
- Proibir publicidade de alimentos com selos direcionada a crianças em qualquer meio de comunicação.
Com isso, comidas com embalagens que mostram índices superiores aos estabelecidos na lei que usavam desenhos de super-heróis, brindes e/ou qualquer atrativo extra não podem mais ser comercializadas no país.
“O foco foi tratar de proteger todos os estudantes com menos de 14 anos, para evitar esse estímulo direto de quem é mais vunerável. Como fomos reduzindo a publicidade, a população começou a entender como o governo informava sobre o que se consumia”, explicou Matias Portela, da Divisão de Políticas Saudáveis do Ministério da Saúde do Chile.
Por enquanto, de acordo com Fernandes, não houve uma redução nos índices de obesidade infantil no país. Novos dados serão divulgados em dezembro deste ano. “Nós não esperamos resultados como esse a curto prazo. Começamos mudando a ideia como as pessoas consomem”.
Resultados
A política de selos, segundo dados do Ministério da Saúde, conseguiu mudar a forma como os chilenos fazem compras no supermercado.
Seis meses após a implementação, o órgão fez uma pesquisa e 67,8% dos entrevistados disseram que são influenciados e escolhem alimentos com menos selos. Outros 9,7% disseram que nem chegam a consumir os produtos com mais avisos e 14,1% afirmaram que compram menos do que se o produto não tivesse os selos. Apenas 8,4% disseram que a nova medida não teve influência.
Foram ouvidos 1.067 homens e mulheres maiores de 18 anos, com diferentes níveis socioeconômicos.
No entanto, uma pesquisa mais recente e independente, da consultora chilena GFK Adimark, mostra resultados menos promissores. Com uma amostra maior, foram entrevistadas 4.800 pessoas entre janeiro e fevereiro deste ano.
Dentre os participantes, 87% disseram que já tinham escutado ou lido sobre os novos selos nos alimentos. Dos entrevistados, 37% concordaram que eles mudaram sua forma de escolher certos alimentos, enquanto 31% ficaram neutros e 33% não estiveram de acordo que a política tivesse mudado seus hábitos.
Brasil estuda
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Ministério da Saúde realizaram um painel para tratar de novas propostas para os rótulos de alimentos. O evento, que aconteceu nesta quinta-feira (9), abriu o debate ao público para falar sobre o tema.
A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), escritório da Organização Mundial da Saúde (OMS) nas Américas, defende que a política do Chile seja adotada pelo governo brasileiro. A proposta também é analisada pelos órgãos de saúde do Uruguai.